Justiça confirma: plantio de cana em área indígena não deve ter financiamento público
A Justiça negou pedido da Federação da Agricultura de Mato Grosso do Sul (Famasul) para que o Ministério Público Federal (MPF) fosse impedido de enviar às instituições financeiras recomendação contra financiamentos públicos para plantio de cana em áreas reconhecidas como de tradicional ocupação indígena.
Expedida em setembro do ano passado, a recomendação do MPF foi dirigida ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Banco do Brasil e Itaú. A recomendação visa apenas as áreas identificadas pelo governo federal, que representam pouco mais de 749 mil hectares, cerca de 2,09% da área total do Estado.
Áreas reconhecidas oficialmente pelo governo federal como territórios indígenas, ou sob litígio judicial, não poderiam servir de garantia para o débito uma vez que os títulos são nulos nos termos do Artigo nº 231 da Constituição Federal. A recomendação lista 39 áreas nesta situação em Mato Grosso do Sul.
Segundo MPF, a não concessão de financiamentos nestas áreas visa acautelar o poder público de eventuais prejuízos ao aceitar como garantia áreas que posteriormente sejam reconhecidas como indígenas.
As áreas apresentam demandas judiciais que podem acarretar a perda da propriedade e a consequente perda de todos os recursos públicos neles investidos.
Trata-se de mera transposição para a esfera pública da cautela utilizada pelo cidadão comum ao adquirir bens ou conceder créditos, para os quais exige-se garantia real.
A ação ajuizada pela Famasul cita especificamente a recomendação enviada ao Banco Itaú, que tinha financiamento contratado com a Usina Nova América, de Caarapó, no sul do Estado, supostamente de mais de R$ 200 milhões.
O Banco Bradesco também financia fornecedores da Usina Nova América com recursos do FAT/BNDES para plantio.
Ambos disponibilizam recursos públicos para plantio de cana na fazenda Santa Claudina e São Sebastião do Ipacaraí, que incidem sobre a Terra Indígena Guaryroka, também em Caarapó.
Fornecedora da Coca-Cola está irregular
A Usina Nova América pertence à multinacional Raizen, fruto da fusão dos grupos Shell e Cosan. A empresa, uma das principais fornecedoras da Coca-Cola no país, recentemente anunciou a conquista da certificação Bomsucro, que garante critérios sustentáveis na produção de cana e derivados e é exigida pela União Européia.
A Raizen quer a certificação estendida para todos os fornecedores, o que inclui a Nova América. Entre os critérios utilizados para a certificação está o respeito aos direitos humanos –direitos indígenas incluídos– o que contrasta com a utilização de matéria-prima vinda de uma área que foi reconhecida como terra Indígena pelo governo federal em outubro de 2009.
- Tal prática também se opõe às diretrizes de sustentabilidade do grupo Raizen - assinala o MPF.
Quando for demarcada, a Terra Indígena Guaryroka terá 11,4 mil hectares e será ocupada por indígenas da etnia guarani-kaiowá. Atualmente, a comunidade aguarda o desfecho do caso em uma pequena área de aproximadamente 50 hectares, no município de Caarapó.
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